Empresas miram no nicho de turismo que foca na preocupação com o meio ambiente e que inclui no roteiro de viagem a fauna, a flora e a cultura local.
Reprodução/Instagram @somosvivala 21.10.2022
Empresas miram no nicho de turismo que foca na preocupação com o meio ambiente e que inclui no roteiro de viagem a fauna, a flora e a cultura local.

Em um mundo pós-pandêmico , que ainda se recupera do impacto que a Covid-19 deixou no planeta, diversos setores da sociedade têm revisto a maneira que operam suas atividades. Algumas das novidades, como o home office  integral, vieram para ficar e velhos hábitos já não são mais aceitos, seja na rotina das pessoas ou no trabalho.

O turismo foi um dos setores mais prejudicados , devido ao isolamento social necessário para a contenção da proliferação do vírus, e este segmento também não deixou de rever seus conceitos até então praticados. Uma das iniciativas do setor que já ocorria antes e que se intensificou a partir da pandemia é o turismo sustentável , que é apontado como um caminho necessário para este mundo pós-pandemia - que cada vez mais se alarma sobre as  mudanças climáticas.

Turismo sustentável pelo mundo

Portugal , por exemplo, lançou em outubro de 2020 o 'Plano Turismo + Sustentável 20-30', com mais de 70 propostas de projetos e ações, com o propósito de posicionar o país “como um dos destinos mais competitivos, seguros e sustentáveis do mundo por meio de um desenvolvimento econômico, social e ambiental em todo o território”.

Em 2020, o país se tornou ainda membro do Conselho Global de Turismo Sustentável e teve 11 lugares na lista dos “100 destinos mais sustentáveis do mundo”, do Green Destinations, divulgada naquele ano. 

Em dezembro de 2020, o Ministério do Comércio, Indústria e Turismo da Colômbia lançou a primeira 'Política de Turismo Sustentável: Unidos pela Natureza', que “reconhece a importância do turismo como parte da conservação da biodiversidade, paisagens, ecossistemas e recursos naturais da Colômbia”.

Na mesma direção, a Suíça  lançou a Swisstainable - estratégia para tornar o país o destino mais sustentável do mundo. O Conselho Federal Suíço também assumiu o compromisso de criar uma nação neutra em impactos para o clima até 2050.

Outros países como Japão , Noruega  e Costa Rica também estão entre os que já compreenderam a importância do turismo sustentável e como boas práticas desenvolvem o setor.

Brasil

Aqui no Brasil , algumas empresas também já entenderam a importância desse movimento e que ele significa uma tendência importante de futuro, tanto do ponto de vista ambiental, como também econômico.

A pesquisa “Relatório de Viagens Sustentáveis”, edição 2022, realizada pela Booking.com, revelou que cresceu o desejo por parte dos turistas por escolhas mais conscientes em toda a experiência de viagem.

Realizada com mais de 30 mil viajantes, de 32 países e territórios, incluindo o Brasil, o estudo mostrou que 90% dos entrevistados brasileiros pretendem viajar de forma ecologicamente correta nos próximos 12 meses.

Visão panorâmica do Pantanal
Jose Sabino/Pixabay
Visão panorâmica do Pantanal

O levantamento também apontou que 86% dos brasileiros dizem que estão mais propensos a escolher uma acomodação sustentável, e dois terços (65%) dos viajantes do país afirmam que os esforços feitos por acomodações e provedores de transporte em prol do meio ambiente têm um grande papel na hora de decidirem contratar esses serviços.

O cofundador e diretor-executivo da Vivalá - Turismo Sustentável no Brasil, Daniel Cabrera, avalia que o governo brasileiro deve institucionalizar sua visão nacional sobre turismo sustentável. Com a maior biodiversidade do mundo, o Brasil deve proteger seus biomas, como a Amazônia , e precisa aproveitar sua aptidão para experiências em unidades de conservação, segundo o empresário.

“O turismo sustentável conserva biomas, enaltece a cultura de comunidades locais, gera emprego e renda digna, e não precisa de um superinvestimento inicial em infraestrutura”, afirma Cabrera, que também aponta outras medidas que devem ser tomadas.

“Precisamos fomentar iniciativas em parcerias público-privada, capacitar a força de trabalho e transformar a divulgação do país no exterior de ‘sol, samba e futebol’ para algo que contemple realmente a nossa gigante diversidade natural e cultural. Temos um poder para o turismo sustentável ainda totalmente subaproveitado”, analisa.

O impacto positivo do turismo sustentável

O turismo sustentável traz uma experiência única para quem consome o serviço, mas também para quem o presta - e não somente as agências de turismo. A atividade pode ser sentida também na melhoria das condições de saúde e educação das populações tradicionais que vivem nestas áreas ricas de biodiversidade.

O Cacique Teka Shanenawa representa a Aldeia Indígena Shanenawá e afirma que o turismo sustentável na região "tem trazido muito aprendizado, conhecimento e ajuda financeira".

"Facilita a saída das pessoas para buscar conhecimento fora da aldeia e depois aplicá-los aqui. O turismo vem ajudando nas dificuldades que temos, inclusive contribuindo na faculdade das minhas duas filhas. Nunca na nossa história tivemos esta oportunidade”, conta o indígena.

O Cacique Teka Shanenawa da Aldeia Indígena Shanenawá.
Vivalá/Divulgação
O Cacique Teka Shanenawa da Aldeia Indígena Shanenawá.


O cofundador e diretor de operações da Vivalá, Pedro Gayotto, explica que a empresa trabalha com oito destinos no Brasil, atingindo três biomas - Amazônia, Cerrado e Caatinga - no total de oito estados. Ela afirma ainda que a agência tem o foco de trabalhar em Unidades de Conservação e Terras Indígenas , que são territórios que sofrem pressão por desmatamento e redução de área.

"Na Amazônia, trabalhamos com a Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Rio Negro, a Flona Tapajós e a terra indígena Ktukina/Kaxinawa. No Cerrado, com os Parques Nacionais da Chapada dos Veadeiros e Grande Sertão Veredas. Na Caatinga, com o Parque Nacional da Chapada Diamantina e o Geoparque Seridó, além do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses - área de transição entre os três biomas", diz.


Voluntariado

Outra experiência que o turismo sustentável pode proporcionar é do voluntariado , que pode trazer amadurecimento e destaque profissional para quem busca uma experiência in loco. A gestora ambiental Maria Luiza Bregieiro Abuassi desenvolveu um trabalho do tipo por duas semanas com animais quelônios - as tartarugas de água-doce.

"Peguei o período da desova das tartarugas de Rio Negro. Eu saía bem cedo de manhãzinha para pegar os ovos nas campinas, onde as tartarugas costumam desovar, para colocar na chocadeira, que é um lugar mais seguro tanto de predadores naturais - como aves e grandes lagartos -, como também da caça ilegal", conta a gestora ambiental.

Maria Luiza explica que havia também uma outra demanda, mais voltada para a parte social voltado às comunidades ribeirinhas locais.

"Dialogávamos com as pessoas falar sobre a importância do projeto dos quelônios do Rio Negro, na tentativa de conscientizar os moradores locais a não comerem ou venderem os ovos", diz a voluntária que complementa afirmando que o trabalho era difícil, uma vez que a venda dos ovos representava uma fonte de renda para as comunidades.

A gestora ambiental Maria Luiza Bregieiro Abuassi durante o trabalho voluntário nas campinas do Rio Negro, na Amazônia.
Maria Luiza Bregieiro Abuassi/Arquivo Pessoal
A gestora ambiental Maria Luiza Bregieiro Abuassi durante o trabalho voluntário nas campinas do Rio Negro, na Amazônia.


Diante da resistência, a gestora ambiental explica que a alternativa encontrada foi a de explicar que mesmo que os moradores vendessem ou comessem os ovos, o ideal era que ao menos uma parte fosse preservada, para manter as espécies dos quelônios vivas. Ela conclui afirmando que aprendeu muito sobre o dia a dia da comunidade local

"O modo de vida deles, a busca por fonte de renda, a culinária e as expressões locais... pude ver de perto como os ribeirinhos contribuem para o desenvolvimento sustentável da Amazônia", finaliza.

Sustentabilidade em Barra do Cunhaú (RN)


Outra agência que realiza um trabalho que alinha turismo e sustentabilidade é a Natureza Tur, especializada em passeios de barco de turismo ecológico em Barra do Cunhaú , no  Rio Grande do Norte.

Na década de 1990, a região do litoral sul potiguar viu as caças de camarão e de carne de caranguejo destruírem parte dos manguezais, o que ameaçava a biodiversidade local. José do Egito de Oliveira, conhecido como o Zequinha, já organizava na época pequenos passeios de jangada e resolveu agir diante dos ataques ao ecossistema local.

A Natureza Tur foi fundada nos anos 2000, fruto do trabalho do empreendedor, junto à comunidade local, de reflorestar o manguezal antes destruído. Zequinha conta que a empresa teve muita dificuldade com o cenário de pandemia.

"Tive que demitir muitos colaboradores e perdemos muitos clientes. Por falta de recursos, ficamos quase sem condições de continuar o trabalho que vínhamos fazendo ao longo dos anos", explica. Contudo, o empreendedor se mostra otimista quanto ao futuro: "Estamos sobrevivendo com esperança de tudo voltar o normal".

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