Uma nova pesquisa da Proteção Animal Mundial revela que tanto cidadãos sul-africanos quanto turistas internacionais de nove nacionalidades querem o fim da caça esportiva em favor de experiências amigáveis à vida silvestre no leque de atrativos turísticos da África do Sul. A informação é publicada em paralelo à realização de uma consulta pública sobre o documento preliminar oficial de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade por parte do governo sul-africano.
O levantamento evidenciou uma oposição universalmente forte à atividade, além de posturas favoráveis ao financiamento da proteção da fauna silvestre do país por meio de alternativas não letais, tais como o turismo responsável.
Para isso, foram ouvidas 10,9 mil pessoas de todo o mundo, incluindo visitantes estrangeiros dos principais mercados emissores de turistas à África do Sul residentes fora do continente africano (Reino Unido, Estados Unidos, Alemanha, França, Holanda, Austrália, Índia, Brasil e Canadá), além dos próprios cidadãos sul-africanos. As entrevistas foram conduzidas pela agência londrina Flood & Partners durante o mês de abril. Ao todo, 1091 brasileiros foram consultados, quantidade semelhante às dos demais estrangeiros.
O estudo foi concebido para compreender as inclinações nos principais mercados emissores de turistas para a África do Sul em relação à caça esportiva, para averiguar as percepções dos cidadãos locais em relação à prática e em oposição a alternativas de turismo amigáveis com a vida selvagem, além de avaliar quais caminhos são considerados aceitáveis como parte de estratégias futuras da África do Sul para o turismo sustentável da vida selvagem.
Para se ter uma ideia da importância do segmento, segundo dados do Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC, The Economic Impact of Global Wildlife Tourism 2019), em 2018 o turismo de vida silvestre contribuiu diretamente com US$ 120 bilhões para as economias ao redor do globo. Adicionando os benefícios indiretos da cadeia de suprimentos, a contribuição total do nicho salta para US$ 343,6 bilhões ou 3,9% do PIB global de Viagens e Turismo no ano.
Especificamente em relação à realidade brasileira, em 2019, último ano fechado antes dos impactos da pandemia de Covid-19, o Brasil recebeu 6,3 milhões de visitantes estrangeiros, que gastaram aproximadamente US$ 6 bi por aqui. O Estudo da Demanda Turística Internacional (Ministério do Turismo, 2019) aponta que “natureza, ecoturismo ou aventura” foi a segunda principal motivação dos estrangeiros que vieram a lazer para o país, respondendo por quase 19% do total das viagens da categoria.
A título de comparação, números da Organização Mundial do Turismo (International Tourism Highlights 2020) mostram que em 2019 a África do Sul recebeu 10,3 milhões de turistas internacionais, que deixaram divisas da ordem de US$ 8,4 bilhões no país.
Portanto, diante da percepção de sinais confusos sobre a conciliação entre turismo sustentável e desenvolvimento econômico por parte do governo sul-africano ao longo do último ano, a Proteção Animal Mundial, organização não-governamental que trabalha em prol do bem-estar animal, encomendou a pesquisa a fim de qualificar o debate público.
Opiniões dos brasileiros
Diferentemente da África do Sul, a caça esportiva ou comercial de animais silvestres é proibida no Brasil há mais de meio século. Essa postura nacional consolidada aparece refletida nos sentimentos dos brasileiros ao avaliarem as perspectivas para o turismo daquele país.
De forma geral, os brasileiros acreditam que a exploração da caça como atrativo turístico é algo nocivo para a reputação do país africano, e algo que os desestimula decisivamente a realizar uma visita. Parecem, todavia, ligeiramente mais tolerantes com a ideia quando a caça é dissimulada como política de conservação.
Por outro lado, entendem que as práticas amigáveis à vida silvestre devem realmente ser priorizadas, com maior predileção para santuários de animais, observação distanciada e expedições fotográficas. Já as alternativas que envolvem sofrimento animal são rechaçadas como caminhos para o desenvolvimento.
Numa análise mais detalhada, cerca de 75% dos brasileiros ouvidos acreditam que adoção da caça esportiva como um pilar da economia e da política de conservação da África do Sul prejudicará a reputação do país como líder de conservação na África, uma proporção bastante alinhada com o número global (74%). Os brasileiros foram um pouco mais aderentes à essa afirmação do que os australianos (74%), canadenses (73%), indianos (70%), e muito mais favoráveis do que os americanos (68%).
Quando perguntados se ficariam desestimulados como turistas a visitar um país que tem a caça esportiva como uma parte fundamental de sua economia e política de conservação, os brasileiros, ainda que manifestando ampla rejeição à proposição (66%), mostraram uma das menores adesões, junto com os americanos (65%). A concordância global nesse caso foi de 72%.
Quando questionados em relação à inclinação para visitar um país que encoraja a caça esportiva como uma forma aceitável e sustentável de manejar suas populações de animais selvagens, os brasileiros continuaram se mostrando majoritariamente desestimulados, numa taxa mais alta (68%) do que na proposição anterior, novamente ligeiramente abaixo do patamar global (71%) e num nível pouco acima dos americanos (65%), os menos aderentes.
Já em relação à ideia de que o governo sul-africano deve priorizar o turismo amigo da vida selvagem ao invés da caça esportiva como parte fundamental da economia e política de conservação do país, os brasileiros foram esmagadoramente favoráveis (90%). A adesão, nesse caso, foi bem superior à concordância global (84%) e em linha com a dos franceses (90%).
Práticas turísticas aceitáveis
Os entrevistados também foram interpelados especificamente em relação a diversos tipos de práticas aceitáveis para o turismo sul-africano como forma de identificar alternativas positivas e de potencial para o desenvolvimento da atividade.
Juntamente com australianos (95%), britânicos (94%) e canadenses (93%), os brasileiros (93%) foram os mais amplamente favoráveis a santuários de vida silvestre (locais onde os animais são resgatados e recebem cuidados adequados por toda a vida) como modelo positivo. O dado global foi de 91%.
Concordância semelhante foi registrada para a proposta de turismo limitado à observação e fotografia dos animais em seus habitats naturais. Os australianos (94%) lideraram o apoio à prática, seguidos de brasileiros (93%), canadenses (93%) e britânicos (92%). O dado global foi de 91%.
Já os zoológicos, ainda que aceitos, contam como menor apoio: 82% dos turistas internacionais aceitam o modelo. Brasileiros (89%) e australianos (89%) são os mais favoráveis à modalidade.
Práticas turísticas que envolvem sofrimento animal foram majoritariamente rejeitadas pelos viajantes internacionais. Fazendas comerciais de vida silvestre (instalações nas quais os animais são criados e usados para entretenimento, abate e comercialização) foram vistas como aceitáveis para apenas 23% dos britânicos, 24% dos brasileiros e 26% dos franceses (32% global).
A maioria dos indianos (51%) ouvidos, entretanto, viram a ideia com bons olhos. Prática mais extrema, a caça e o abate de animais para esporte ou entretenimento foi tida como aceitável para apenas 19% dos turistas ouvidos. Britânicos (12%), brasileiros (13%) e alemães (14%) foram os menos tolerantes.
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