33 anos após milhares de pessoas fugirem às pressas das cidades dos arredores da usina de Chernobyl, o movimento hoje é justamente o contrário. Graças ao sucesso da série da HBO, que mistura informações reais e fictícias para recontar o maior desastre nuclear da história, tem crescido o número de turistas que visitam a Ucrânia para conhecer a cidade fantasma de Pripyat e outros locais - uma agência de turismo local disse à Reuters que a procura chegou a crescer 40% desde o lançamento de "Chernobyl".
Mais turistas podem significar uma injeção de dinheiro na economia local, mas provocam também episódios desagradáveis, como visitantes que tiram selfies sorridentes ou, pior, até a roupa em um local marcado para sempre por tristeza e morte. Diretor da série da HBO, Craig Mazin pediu que o estrangeiro que visitar a usina de Chernobyl tenha "respeito".
Ainda que a série " Chernobyl
" esteja bombando e a toda a aura que envolve um acidente nuclear e cidades abandonadas despertem a curiosidade alheia, muitos se perguntam: por que visitar um local com um passado tão trágico e cujo tour é extremamente restrito?
Para ter essa resposta, o iG Turismo conversou com viajantes que estiveram na Zona de Exclusão de Chernobyl em 2012 e 2018. Mas, antes, você pode conferir no infográfico abaixo o que é preciso para visitar o palco do desastre de 1986 e as principais regras do tour.
Visitar a usina de Chernobyl é como visitar as ruínas romanas
"Por mais que tenha acontecido um acidente ali, são ruínas também, assim como as ruínas romanas, as ruínas medievais. É como se tivesse um fragmento da União Soviética nos dias de hoje", afirma Larissa Pereira, do blog Vida Cigana.
Ela e o marido viajaram para lá em julho de 2018, e pagaram 99 euros (cerca de R$ 432 na cotação atual) pelo tour até o local do acidente nuclear de Chernobyl . A ideia de visitar a Zona de Exclusão surgiu quando os dios decidiram viajar pela Europa. Por isso, incluíram Kiev no roteiro e agendaram o passeio quando chegaram à capital ucraniana.
Segundo Larissa, o único imprevisto que eles enfrentaram durante a viagem foi antes de partirem para a usina de Chernobyl. No dia anterior ao agendado, a empresa entrou em contato avisando que o governo havia fechado a área. O passeio, então, foi adiado para a data seguinte.
"Ou seja, se você estiver com os dias contados em Kiev, pode ser que algo assim aconteça e você não tenha outra opção a não ser receber o dinheiro de volta. Tem que agendar com antecedência e ter alguns dias de folga", alerta.
Mesmo com a frustração do reagendamento, o passeio ainda valeu cada centavo pago, conta Larissa. A parte mais marcante da viagem, para ela, foi entrar nos apartamentos abandonados às pressas pelos habitantes de Pripyat, cidade vizinha à usina.
Ela disse que ficar dentro dos apartamentos lhe deu, em uma palavra, uma sensação de fragilidade: "Você consegue imaginar a vida ali, você consegue se imaginar no apartamento". Isso porque boa parte deles, além de serem relativamente modernos, permaneceram intocados desde o acidente em 86 - o que significa que mobília, itens pessoais, de fogões a brinquedos, permanecem onde estavam quando a cidade foi evacuada.
Mas, apesar dessa sensação, Larissa afirma que recomendaria a qualquer um que tivesse interesse em visitar a região. "Eu acredito que seja uma das formas mais genuínas de refletir sobre a vida", finaliza.
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"O cenário ali é chocante"
Tiago Leme, do blog Bora Viajar Agora, também esteve na Ucrânia, mas em 2012: "O que mais me marcou, sem dúvida, foi andar pelas ruas e construções de Pripyat. O cenário ali é chocante. Passei por prédios vazios com mobílias e objetos deixados para trás, bonecas e brinquedos de crianças pelo chão, pedaços de roupa".
Ver essas coisas de perto deram a ele uma nova perspectiva sobre as coisas, principalmente quando ele parava para pensar que estava passando por um local que, há pouco mais de 30 anos, havia sofrido tanto com o acidente nuclear de Chernobyl.
O que passava por sua cabeça era, principalmente, "que famílias tinham deixado suas casas às pressas, sem ter a oportunidade de voltar e resgatar objetos pessoais… é quase uma viagem no tempo".
Tiago conta que desembolsou US$ 150 pelo tour (cerca de R$ 577 na cotação atual e, obviamente, muito acima da cotação na época) e que, diferente de Larissa, estava em Kiev a trabalho quando decidiu visitar a região atingida pelo desastre.
"Apenas uma semana antes eu fiz a reserva pela internet. Para ir, é necessário fechar um tour guiado com alguma agência credenciada, que tenha permissão do governo da Ucrânia para levar turistas até o local", lembra.
O jornalista relata que, além das restrições às vestimentas (só é permitido entrar no local com roupas que cubram todo o corpo), as únicas coisas que ele teve de fazer foram levar o passaporte e a ssinar um documento declarando estar ciente de que estava prestes a visitar uma zona com radioatividade.
E pelas coisas que viu e pela oportunidade de visitar um local que une história e surpresa, Tiago afirmou que também recomendaria a viagem para qualquer um. "Já viajei para muitos lugares do mundo, mas Chernobyl com certeza é uma das experiências mais diferentes e que ficam marcadas para sempre na vida", crava.
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Mais do que isso, para ele, visitar a usina de Chernobyl foi uma ótima oportunidade para conhecer um mundo que vai além dos Estados Unidos ou mesmo das capitais europeias. E aí, ficou com vontade de ir para Pripyat?