Meu 2023 começou com um convite: conhecer Miami e Miami Beach, nos Estados Unidos, para mostrar como as cidades são amigáveis para a comunidade LGBTQIA+. A proposta chegou em um momento importante para mim. Eu, homem gay e brasileiro, vinha de um difícil ciclo de quatro anos de opressão social mais descarada, e a mudança de governo simbolizava, finalmente, uma esperança de sentir-se um pouco mais acolhido em meu próprio país.
Para entender a importância da proposta é preciso, inicialmente, se colocar no lugar de uma pessoa LGBTQIA+ no Brasil nos últimos anos. Os repetidos ataques feitos por autoridades na mídia, a ausência de políticas públicas e os episódios constantes de intolerância e violência que ganharam os jornais fizeram com que algo que não deveria ser aceitável se tornasse parte constante das nossas vidas: o medo. Sem você se dar conta, passa a pensar e repensar se tudo bem usar determinada roupa, se o local onde está é mais ou menos seguro para ti, se você estará sozinho ou com mais gente, se pode ou não andar de mãos dadas na rua etc. Ou seja, muitas vezes para nós nos escondermos é questão de sobrevivência.
Portanto, chegar em Miami Beach foi uma experiência. Muitas desses comportamentos como os citados no parágrafo anterior só são percebidos justamente quando eles deixam de fazer parte da nossa rotina. E como é libertador se livrar deles. No caminho entre o aeroporto, em Miami (sim, são duas cidades diferentes. Mas isso é tema para outro texto), e o hotel, passei por diversos estabelecimentos comerciais com a bandeira do arco-íris do lado de fora. Também é comum ver casais homossexuais na rua livremente.
Fique à vontade
Minha primeira hospedagem foi no Moxy Miami South Beach. O hotel, com quartos confortáveis e estilo modernoso, foi reconhecido em 2021 por ser inclusivo para a comunidade LGBTQIA+. Fica a duas quadras da praia, próximo a restaurantes, casas noturnas, lojas e espaços de arte. Quem quiser aproveitar a areia e a brisa do Atlântico Norte, tem cadeiras e guarda-sol disponíveis na beira-mar. Se você preferir piscina, a boia em formato de unicórnio, ao lado de outras que reproduzem frutas cítricas, são perfeitas para se sentir “no Vale”. O recorte de vidro no chão permite interagir com as pessoas no saguão durante o mergulho.
Um dos pontos mais ao sul dos Estados Unidos, Miami e Miami Beach apreciam bastante a cultura latina. E não é ao acaso. Boa parte dos turistas são das américas Central e do Sul, assim como a mão de obra que faz as engrenagens das cidades rodarem. Aliás, dizer que é brasileiro conta ponto na hora de flertar nas casas noturnas.
Para quem quer se sentir em casa, o Moxy realiza semanalmente a “Samba Sundays”, uma festa com carnaval, pagode e passistas. No Como Como, um dos restaurantes do hotel, a feijoada brasileira é destaque durante o dia. Já a festa ao ar livre do estabelecimento ganhou o nome de “Na Laje Rooftop Party”, uma referência bem direta a um dos mais populares estilos de confraternização por aqui.
Mas vale destacar que, apesar da recepção, não se trata de um hotel temático. É apenas um local onde se sentirá acolhido, seja você quem for – e como deveria ser em qualquer local.
Outra opção de hospedagem é o AxelBeach, também em localização privilegiada no coração de Miami Beach. As bandeiras LGBTQIA+ do lado de fora dificultam que alguém entre desavisado no espaço. Mas, se ainda assim acontecer, a frase “we are heterofriendly” (somos amigáveis com heterossexuais) deixa claro que ninguém ali é discriminado.
Agora, se a intenção do turista for ter contato só com “as mana” na viagem, o Gaythering é a hospedagem perfeita. Como se vê, tem gay até o nome. Com uma área exclusiva para homens, o local une hotelaria, bar e sauna no mesmo endereço.
Seja livre
Independentemente dos planos de quem viaja, se é dar pinta e curtir o fervo, desfrutar da arte e da cultura local ou aproveitar os dias de sol na praia, uma coisa Miami Beach vai entregar: a sensação de liberdade e pertencimento. Afinal, é difícil estar na cidade e não ter nenhum contato com a comunidade LGBTQIA+. As pessoas não estão escondidas, há diversas vitrines voltadas exclusivamente para esse público,
o som dos leques batendo durante os shows de drag queens ecoam por toda a região próxima ao icônico Palace Bar
... e o barulho faz mais sentido ainda com as diversas bandeiras e outras referências espalhadas pela cidade. É uma experiência que para nós, brasileiros, mesmo os que vivem na mais cosmopolita das capitais, não está acostumado. Não se trata de ter “points gays”, mas sim de uma cidade toda que respeita a sua existência, onde a polícia espalha placas com as cores do arco-íris e incentivando as denúncias de crimes e importunações contra essa comunidade.
O curioso é que Miami e Miami Beach são cidades da Flórida, um estado superconservador e abrigo para as mais reacionárias ideias da direita. Não por acaso, foi o local escolhido para o retiro de Jair Bolsonaro após deixar a presidência.
Orgulho escancarado
Entre os meses de março e junho acontece a Rainbow Spring (ou primavera do arco-íris, em tradução livre), com uma série de eventos dedicados à comunidade LGBTQIA+. Entre os dias 1º e 16 de abril acontece a Miami Beach Pride, que inclui um festival de música, festas temáticas e, fechando a programação, a Parada do Orgulho, que ocupa 10 quarteirões da Ocean Drive, importante avenida de frente para a praia e repleta de restaurantes, cafés e hotéis de arquitetura clássica.
Entre os dias 20 e 30 de abril, o OUTshine Film Festival, que está na 25ª edição, exibe as produções dos principais LGBTQIA+ emergentes.
Na grande Miami, acontece o 15º SweetHeat Miami acontece entre 16 e 22 de maio. O festival inclui festas, shows e experiências gastronômicas feitas por mulheres para mulheres. Além disso, até 23 de abril, a exposição "Give Them Their Flowers" (Dê-lhes suas flores, em tradução livre) conta a história LGBTQIA+ negra de Miami, reunindo imagens, vídeos e obras dos artistas Vanessa Charlot, Kendrick Daye, Woosler Delisfort e Loni.