"Todo mundo dizia que era perigoso para gays", afirma jornalista que fez mochilão na Ásia

Diogo Augusto visitou 14 países e destaca sua percepção como um homem gay em países que possuem legislações anti-homossexualidade

Diogo ressalta que se sentiu seguro nos países em que visitou
Foto: Diogo Augusto
Diogo ressalta que se sentiu seguro nos países em que visitou

Viajar demanda uma série de etapas, como, por exemplo, o planejamento de quantos dias, montar um  itinerário e organizar o dinheiro para não passar perrengue. Quando falamos em viagens internacionais , montar uma viagem ganha outras questões, como entender a cultura local, costumes e, para alguns grupos, saber se você está seguro no país apenas por ser quem você é. 

Um levantamento feito pela Human Trust Dignity em junho de 2024 aponta que 64 países membros ou observadores da  Organização das Nações Unidas (ONU) criminalizam a homossexualidade, com penalidades que vão desde prisão até a pena de morte. Entre os continentes com mais países que possuem legislações contra a comunidade LGBTQIAPN+ estão a África, com 32 países, e a Ásia, com 22 países.

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Entretanto, ainda que a  Ásia seja um dos continentes que mais possui países contra a comunidade LGBTQIAPN+, o continente também se destaca com países que apoiam fortemente seus artistas queers e que fazem avanços na medicina para melhor atender pessoas que buscam por cirurgias de afirmação de sexo. A rica diversidade cultural e a curiosidade por lugares não tão convencionais despertou uma vontade em Diogo Augusto para fazer um mochilão pelo continente.

Diogo é jornalista por formação, mas trabalha atualmente na área de marketing. Sua paixão por viajar começou desde pequeno, com ele adorando matérias como geografia e história na escola e se imaginando como seria visitar diversos dos lugares que ele lia nos livros didáticos. Ele cresceu e sua paixão também.

“Eu ficava lendo revistas de viagem e essas coisas, e sempre me imaginava nesses lugares. Quando tive a oportunidade de fazer minha primeira viagem, parece que fui mordido pelo 'bichinho da viagem'. Toda vez que posso, gosto de ir para algum lugar novo, geralmente lugares que as pessoas não costumam visitar, sabe?”, afirma o jornalista ao iG Turismo .

Para Diogo, o importante não é fazer compras no local ou consumir coisas luxuosas, mas sim conhecer o lugar, explorar as possibilidades e conversar — mesmo que sem nem saber a língua — com as pessoas ao seu redor. Entrar de cabeça na viagem e se deixar levar. Foi então que, em uma de suas buscas por mais uma aventura, ele decidiu fazer um  mochilão por 14 países da Ásia.

“Mochilão é muito tempo de viagem, são muitos lugares em que você para, então resolvi deixar as coisas meio em aberto, sabe? Tipo, se eu gostar de um lugar, fico mais tempo; se não gostar, vou embora, para ter um pouco mais de flexibilidade. Porque, se você deixa tudo muito planejado em um mochilão, acaba ficando tudo muito engessado”.

Sudeste asiático

Diogo ressalta que se sentiu seguro nos países em que visitou
Foto: Diogo Augusto
Diogo ressalta que se sentiu seguro nos países em que visitou

Suas aventuras na Ásia foram muitas, mas as mais marcantes para ele, como um homem gay, foram no sudeste asiático, mais especificamente quatro países: Tailândia, Filipinas, Vietnã e Indonésia. O jornalista afirma que já tinha uma ideia do que esperar de alguns países asiáticos quando o assunto era ser uma pessoa LGBTQIAPN+.

“Sabia que a Tailândia é um lugar mais aberto, com pessoas amigáveis, inclusive com LGBTs. Tanto que, hoje, com a possibilidade das mulheres trans conseguirem a cirurgia pelo SUS aqui no Brasil, ficou mais acessível, mas, antes, muitas iam para a Tailândia, onde há profissionais experientes em cirurgias de redesignação e o custo é mais baixo. Outro lugar que eu também sabia que seria amigável para LGBTs foi nas Filipinas”, explica.

Ele afirma que foi muito interessante observar na Tailândia que pessoas trans e gays afeminadas, que são postas muitas vezes em posições marginalizadas, ocupam espaços que, tradicionalmente, são ocupadas apenas por pessoas hetero-cisgênero.

Entretanto, um choque foi quando visitou a Indonésia. “Todo mundo dizia que a Indonésia é perigosa para gays, que não se pode demonstrar afeto e que é preciso ser mais reservado. O problema é que a Indonésia é composta por várias ilhas, e algumas são muçulmanas. Nelas, realmente é preciso ter cuidado, mas a ilha mais visitada por turistas é Bali, que é hindu e famosa, por exemplo, pelo filme [ Ingresso para o Paraíso]  da  Julia Roberts . Bali é tolerante, vive do turismo; então, eles não fariam algo que prejudicasse isso.”

Foto: Diogo Augusto
Diogo ressalta que se sentiu seguro nos países em que visitou

Mesmo que ele soubesse que, provavelmente, nada de ruim aconteceria com ele naquele país, alguns sinais ainda o deixavam em alerta quando estava a caminho do país. Um exemplo era o aplicativo Grindr — app de relacionamento utilizado, principalmente, por homens LGBTs — que avisa que é uma região perigosa, sem mostrar distâncias e misturando perfis.

Entretanto, tudo mudou quando pisou na ilha: “Chegando lá, vi que era diferente: tem hotéis gay-friendly , shows de drag queens até em bares héteros! Foi surpreendente. Vi que os gays andavam pela cidade, saíam à noite, e percebi que a realidade era bem diferente da que eu tinha ouvido. Mas isso foi em Bali. Quando fui para a ilha de Komodo, que é muçulmana, precisei ser mais cauteloso. Embora sejam parte do mesmo país, as realidades são completamente diferentes, não só em relação a LGBTs, mas também às mulheres, que são mais submissas e usam o hijab - véu que cobre os cabelos e o corpo das mulheres muçulmanas, por exemplo”.

Para ele, alguns países que antes tinham uma rejeição à comunidade LGBTQIAPN+ passou a “acostumar” devido ao turismo em massa. “O negócio dependendo do lugar fingir que não existe, sabe? Rola umas coisas assim”.

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Foto: Diogo Augusto
Diogo ressalta que se sentiu seguro nos países em que visitou

“É um país interessante, porque lá a maioria é católica, diferente do resto da Ásia, que é predominantemente muçulmana, hindu ou budista. Como sou mineiro, acabei me identificando, porque entrava naquelas igrejas barrocas com santos de peruca, bem exageradas e coloridas, iguais aos de Minas. Eles amam concurso de miss; o país literalmente para para assistir, e têm concurso de tudo, inclusive missas”, explica.

O jornalista conta que ficou hospedado em um hotel em que havia uma igreja próxima. Na época, ele conseguiu apreciar um desfile de misses da igreja em questão. 

“Eles têm essa cultura forte de miss e drag queens, é como se fossem o Brasil da Ásia. Eles são festivos, abertos e nada envergonhados, diferente de outros países asiáticos, onde as pessoas são educadas e amáveis, mas reservadas. Nas Filipinas, as pessoas vêm falar com você na rua, te dão dicas sobre o que fazer”, diz ele as colocando no mesmo patamar das misses e drag queens venezuelanas, conhecidas por levarem a sério quando o assunto são concursos.

Tratamento diferenciado por ser gay?

Foto: Diogo Augusto
Diogo ressalta que se sentiu seguro nos países em que visitou

Diogo afirma que sentiu uma diferença na maneira como ele era tratado. Entretanto, o motivo não era por ser um homem gay, mas sim por ser brasileiro: “ É engraçado, porque o Brasil é um país que as pessoas geralmente têm um carinho especial, sabe? Você fala 'Brasil' e elas dizem: 'Nossa, Brasil? Que legal!' Não é lenda, é verdade: falar que é brasileiro abre portas em muitos lugares.”

Para ele, a viagem abriu os olhos de como a Ásia pode ser para pessoas da comunidade LGBTQIAPN+. O jornalista destaca a para que visitem: 

  • Tailândia: país barato, comida boa e que pode agradar aos brasileiros, pessoas receptivas e uma vida noturna e diurna vasta, principalmente seguras para pessoas LGBTQIAPN+;
  • Vietnã: país bonito, fácil de explorar, seguro acessível, porém sem um foco no turismo para pessoas LGBTs;
  • Filipinas: ilhas maravilhosas,  muito seguro para a população LGBT, com bastante diversidade;
  • Indonésia: mais especificamente Bali, um país seguro, acessível, lindo e cheio de pessoas simpáticas, muito devido ao turismo local.