Turismo na Coreia do Norte: veja o que diz quem já foi ao país de Kim Jong-un

Para visitar o país, é obrigatório contratar uma agência de turismo; lá, turistas não podem circular sozinhos e têm aparelhos eletrônicos revistados

Talvez o fato de ele ser um país tão fechado e sobre o qual as pessoas não costumam ter muito conhecimento sobre seja justamente o que faz muita gente ter  interesse em fazer turismo na Coreia do Norte e, de fato, conhecer o país governado pelo líder totalitário Kim Jong-un.  


O país pode até parecer totalmente inacessível, mas a verdade é que qualquer indivíduo que não seja sul-coreano pode fazer turismo na Coreia do Norte  - desde que sigam um processo burocrático rígido e respeitem as regras do local. Apesar de a Coreia do Norte ser considerada um país seguro e de população bem receptiva a turistas segundo agências de viagens, o descumprimento de regras pode levar à detenção de estrangeiros.

Para quem pretende fazer turismo na Coreia do Norte, o primeiro passo é buscar uma agência que realiza a viagem até o país. Atualmente, não existe nenhuma agência de turismo brasileira que oferece esse serviço, tornando necessário buscar uma empresa norte-americana, europeia ou até mesmo chinesa para seguir com a viagem.

Apesar de esse ser um processo dispensável em viagens para outros países, ele é essencial para quem quer visitar as terras norte-coreanas. Isso porque o país não permite que pessoas vão para lá “sozinhas”, isto é, desvinculadas de agências. Por não poderem circular sozinhos, os turistas precisam pagar à agência por passeios, guias, traslados e até alimentação com antecedência. A agência de turismo também é responsável por providenciar o visto de turista .

Chegando ao país, além do guia da agência, os turistas são acompanhados por um segundo guia selecionado pelo governo, também obrigatório para fazer turismo na Coreia do Norte. Os dois estão sempre presentes para explicar as regras do país e fiscalizar os visitantes, garantindo que eles não quebrem nenhuma delas. O único momento em que os visitantes podem ficar desacompanhados é no hotel.

Essa “falta de liberdade” na circulação se estende para as atrações turísticas do país. Turistas podem conhecer apenas locais que o regime permite - mas eles não são poucos. A rotina de passeios costuma incluir estátuas, monumentos, espetáculos, museus, fábricas e até fazendas, em Pyongyang (capital norte-coreana) e outras cidades. Também é possível visitar a zona desmilitarizada próxima à fronteira com a Coreia do Sul .

Vale citar que, tanto ao entrar quanto ao sair do país, os turistas são revistados detalhadamente na imigração. Mochilas são fiscalizadas junto com celulares, câmeras e computadores, nos quais os funcionários tendem a analisar principalmente fotos e vídeos. Isso para garantir que o turista não mostre nada "comprometedor" para os locais ou saia do país com registros proibidos. Além disso, livros também são verificados.

E quem já fez turismo pela Coreia do Norte, o que achou?

Foto: Acervo pessoal/João Roberto de Oliveira Moro
O visto, o cartão de turista e a passagem de avião de João, que foi fazer turismo na Coreia do Norte em fevereiro


Sendo um país tão desconhecido e isolado, pode parecer difícil ou até um pouco amedontrador fazer turismo na Coreia do Norte, e é por isso que vale a pena conversar com pessoas que já foram para pegar dicas. João Roberto de Oliveira Moro, de 32 anos, é uma dessas pessoas. Junto da companheira, ele visitou o país em fevereiro buscando conhecer um lugar completamente diferente do que estavam acostumados.

“A Coreia do Norte, por incrível que pareça, é um lugar muito tranquilo para viajar. Em qualquer viagem você tem de se preocupar com tudo, visto, hospedagem, roteiro , traslado... Mas lá, não. Você não precisa se preocupar com nada, a agência de viagens faz tudo por você. Então a organização antes de ir é só procurar uma agência de turismo legal, com um preço legal e que tenha opções de pacotes que se encaixem na sua disponibilidade de tempo de viagem”, conta João ao iG Turismo .

Ele revela, contudo, que também chegou a conversar com o embaixador brasileiro em Pyongyang antes de embarcar para a capital norte-coreana para “ver como estava a situação por lá”. O Brasil é um dos únicos dois países das Américas a manter uma embaixada na Coreia do Norte, e João conta que Cleiton Schenkel, o embaixador, foi bastante solícito. O turista chegou até a passar a ele o contato dos pais por precaução, já que quem viaja para a Coreia do Norte fica incomunicável.

“Uma ligação custava cinco euros por minuto, então nem tentamos. Tentamos ligar para o embaixador, mas a ligação não completou. Mandamos cartões postais, mas eles nunca chegaram”, relembra João.

Para muitos, ficar incomunicável pode parecer um verdadeiro “perrengue”, mas isso não é necessariamente verdade, principalmente se a viagem for de curta duração. Entretanto, falando em “perrengue”, o brasileiro conta um apertoque passou fazendo turismo na Coreia do Norte.

Antes de ir ao país, ele e a companheira já haviam visitado a Coreia do Sul para assistir aos Jogos Olímpicos de Inverno. Já que não é possível ir de Seul (capital sul-coreana) à Coreia do Norte, o casal pegou um voo em Pequim, na China, e, a caminho de Pyongyang, a dupla conheceu um diplomata nigeriano que os aconselhou a não mencionar a visita ao país vizinho na imigração norte-coreana .

Assim, eles deletaram todas as fotos da viagem da câmera e esconderam as que tinham no celular dentro de uma pasta. “Como tudo no celular estava em português, não pensei que fossem achar”, conta João.

Foto: Acervo pessoal/João Roberto de Oliveira Moro
Para fazer turismo na Coreia do Norte é preciso contratar uma agência que organiza toda a viagem


“Na inspeção, o policial começou a olhar meu celular, ver as fotos e nada, tudo bem. Mas aí ele abriu o iMovie [programa de edição de vídeos do sistema iOS]. Eu não sabia que lá você podia clicar e encontrar todos os vídeos do celular. Eu não tinha apagado os vídeos da Coreia do Sul, só escondido, então estava tudo ali.

Quando percebi, comecei a suar frio. A sorte foi que a nossa guia já estava lá nos esperando e falava inglês super bem. Bom, o policial falou alguma coisa para ela e ela perguntou se eu tinha ido para os Jogos de Inverno. Não tinha como eu dizer que não, então admiti. Ela já emendou perguntando se eu tinha gostado. E eu respondi: ‘Gostei’.

Naquela hora eu já estava branco, suando. Mas o cara continuou olhando e liberou, no fim. Mas foi tenso”, diz. Tão tenso que, na volta, João sabiamente decidiu usar uma camiseta do Brasil para tentar conquistar a simpatia dos funcionários. A estretégia funcionou, e ele não teve nenhum de seus equipamentos inspecionados.

Passado o susto inicial, ele afirma ter aproveitado bastante o roteiro da viagem, conhecendo a zona desmilitarizada na fronteira com a Coreia do Sul, um circo, uma escola onde pôde até jogar futebol com as crianças, o museu da Guerra das Coreias, um espetáculo de dança em massa e, em Pyongyang, diversos monumentos, estátuas, mausoléus - aos quais é necessário reverenciar -, e curtiram até um churrasco coreano.

“Nossas guias eram bem legais. No último dia fomos num bar, bebemos todas e elas deram muita risada. Elas faziam muitas perguntas sobre o exterior. Uma delas, que não era a guia ‘principal’, tinha acabado de começar a trabalhar com isso, até nos perguntou se no Brasil tinha agricultura. Uma coisa muito engraçada. As pessoas realmente não têm noção do que acontece no exterior”, relembra João.

Para quem quiser fazer turismo na Coreia do Norte, o principal conselho que ele dá é contratar uma agência de viagens confiável que dê todo o suporte necessário ao turista e proporcione um roteiro interessante (já que elas serão as responsáveis por organizar tudo), e pesquisar um pouco sobre o país.

“E se jogar. Tem de topar tudo, topar respeitar aquele mundo. Por exemplo, quando íamos ao mausoléu, a gente soube que teria de fazer uma reverência e tinham dois suíços que não queriam fazer a reverência, ficaram no hotel. Mas, poxa vida, já que você foi fazer turismo na Coreia do Norte, você encara, né? Vai e faz referência para a estátua ou o que seja, fazer o quê?”, questiona.