Vitor Vianna

Brasileira é impedida de embarcar em Cruzeiro

O episódio revela uma tendência preocupante: a de pessoas que se autointitulam especialistas e acabam ensinando o que, na prática, não dominam

Brasileira é impedida de embarcar em cruzeiro
Foto: Reprodução/IA
Brasileira é impedida de embarcar em cruzeiro

Ontem eu vi nas redes sociais um caso que me deixou bastante intrigado.
Uma brasileira foi impedida de embarcar em um cruzeiro pela Europa por falta de documentação. Mas o que mais me chamou atenção não foi o problema em si, e sim o fato de ela se autointitular influenciadora de viagens, alguém que (segundo o próprio perfil) ensina as pessoas a viajarem gastando menos. E aí eu te pergunto: como alguém pode ensinar aquilo que nem ela mesma domina?

Segundo seu próprio relato em seu instragram, ela mora em Portugal e possui a chamada autorização de residência a CPLP, um documento destinado a cidadãos dos países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Esse título permite que ela viva legalmente em Portugal, mas n ão é um documento de viagem internacional . Ou seja, ele não substitui o passaporte e não autoriza o embarque para outros países europeus ou fora do Espaço Schengen (área de livre circulação que abrange 29 países europeus).

Provavelmente, o erro aconteceu porque ela acreditou que o documento de residência seria suficiente para embarcar. Mas o fato é que um cruzeiro é tratado como viagem internacional, e cada porto exige seus próprios requisitos, vistos e autorizações. O resultado? Ela foi impedida de embarcar. E o sonho, virou frustração.


O problema não é o erro. É o palco.
O mais preocupante é que esse tipo de caso acontece com alguém que ocupa um lugar de fala público, com milhares de seguidores, orientando outras pessoas sobre como viajar. E quando o discurso de “faça sozinho”, “compre mais barato”, “não precisa de agência” vem de quem não domina o assunto, o resultado é esse: gente acreditando em atalhos que simplesmente não existem.

Hoje estamos vivendo uma era em que todo mundo tem a fórmula mágica pra tudo. Ninguém mais quer se profissionalizar, e, ao mesmo tempo, todo mundo quer ensinar. Tem influenciador de viagem que nunca estudou turismo.  Tem nutricionista que não é nutricionista.  Tem “médico de internet” prescrevendo tratamentos sem ser médico.  Tem coach fitness passando treino sem ser profissional de educação física.  E, no meio de tudo isso, uma multidão de seguidores acreditando que basta assistir a um vídeo ou comprar um curso online pra se tornar especialista em qualquer coisa.


A pressa de ensinar sem aprender
A internet deu voz a muita gente, e isso é ótimo quando vem acompanhado de responsabilidade. Mas o que estamos vendo é o oposto: a pressa de ensinar sem antes aprender. A ânsia de ter público, antes mesmo de ter conteúdo. E o resultado é um ecossistema onde a aparência de conhecimento vale mais do que o conhecimento em si.

O caso dessa brasileira barrada no cruzeiro não é só uma falha individual, é um retrato de um tempo em que a ilusão da autossuficiência digital tem custado caro. E, no turismo, esse “caro” pode significar uma viagem perdida, prejuízo financeiro, ou até a impossibilidade de embarcar.


O valor do profissional
O agente de viagens existe por um motivo. É ele quem estuda as rotas, conhece as regras de imigração, entende de documentação, acompanha mudanças, sabe lidar com emergências e oferece suporte antes, durante e depois da viagem. É um profissional que não apenas vende viagens, mas garante experiências sem dor de cabeça. A diferença entre o amador e o profissional é simples: o amador fala sobre o que imagina; o profissional fala sobre o que viveu, estudou e comprovou.  E enquanto o amador ensina atalhos, o profissional mostra o caminho seguro.


No fim das contas, o caso dessa influenciadora deveria servir de alerta, não de chacota. Porque a pergunta que fica é uma só: como é que alguém que foi impedido de embarcar por falta de documentação se propõe a ensinar os outros a viajar? A resposta talvez diga muito sobre o tempo em que vivemos.

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal iG